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REGIME EXCECIONAL PARA SITUAÇÕES DE MORA NO PAGAMENTO DE RENDA DEVIDA NOS CONTRATOS DE ARRENDAMENTO HABITACIONAL E NÃO HABITACIONAL NO ÂMBITO DA PANDEMIA COVID-19

REGIME EXCECIONAL PARA SITUAÇÕES DE MORA NO PAGAMENTO DE RENDA DEVIDA NOS CONTRATOS DE ARRENDAMENTO HABITACIONAL E NÃO HABITACIONAL NO ÂMBITO DA PANDEMIA COVID-19

REGIME EXCECIONAL PARA SITUAÇÕES DE MORA NO PAGAMENTO DE RENDA DEVIDA NOS CONTRATOS DE ARRENDAMENTO HABITACIONAL E NÃO HABITACIONAL NO ÂMBITO DA PANDEMIA COVID-19

 À semelhança do que sucedeu para outras áreas, o Governo veio agora estabelecer medidas excecionais aplicáveis aos contratos de arrendamento, as quais vigoram durante o estado de emergência e no primeiro mês subsequente ao seu termo.

Assim, foi publicada a Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril, que entrou em vigor no dia 7 de abril e que estabelece um regime excecional de mora no pagamento das rendas ou, em alternativa, a possibilidade de recurso a um empréstimo a conceder pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I.P (IHRU, I.P.).

Para a análise do regime do arrendamento durante o estado de emergência é, ainda, necessário ter em consideração a Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, o Decreto n.º 2-B/2020, de 2 de abril, o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março e a Portaria n.º 91/2020, de 14 de abril.

Nos termos da Lei n.º 4-A/2020, durante a vigência das medidas de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conforme determinada pela autoridade de saúde pública e até 60 dias após a cessação de tais medidas, ficam suspensos:

a) A caducidade dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação;

b) A produção de efeitos da revogação, da oposição à renovação de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio;

c) O prazo para exigir a restituição do prédio indicado no artigo 1053.º do Código Civil, se o término desse prazo ocorrer durante o período de tempo em que vigorarem as referidas medidas;

d) A execução de hipoteca sobre imóvel que constitua habitação própria e permanente do executado.

Durante esta fase ficam, igualmente, suspensas as ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa móvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa.

No que respeita à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril propriamente dita, esta aplica-se a todo o território nacional, não só ao arrendamento habitacional e não habitacional, como a outras formas contratuais de exploração de imóveis.

ARRENDAMENTO HABITACIONAL

a) ARRENDATÁRIOS

A Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril aplica-se quando se verifiquem os seguintes requisitos:

  • Quebra superior a 20 % dos rendimentos do agregado familiar do arrendatário face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior; e
  • Taxa de esforço do agregado familiar do arrendatário, calculada como percentagem dos rendimentos de todos os membros daquele agregado destinada ao pagamento da renda, seja ou se torne superior a 35 %;

OU

b) SENHORIOS

  • Quebra superior a 20 % dos rendimentos do agregado familiar do senhorio face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior; e
  • Essa percentagem da quebra de rendimentos seja provocada pelo não pagamento de rendas pelos arrendatários ao abrigo do disposto na referida lei.

São instituídos dois regimes alternativos: mora no pagamento das rendas e apoio financeiro através de recurso a empréstimo.

MORA DO ARRENDATÁRIO

  • Possibilidade de pagamento das rendas que se vençam durante o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, no prazo de 12 meses contados do termo daquele período;
  • O pagamento é efetuado em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total devido, pagas juntamente com a renda de cada mês;
  • Durante este período o senhorio não tem direito à indemnização pela mora no valor de 20% do montante devido, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 1041ºdo Código Civil;
  • Não é aplicável o direito de recusa de recebimento das rendas e alugueres seguintes nos termos previstos no n.º 3 do artigo 1041º do Código Civil;
  • O senhorio só poderá resolver o contrato com fundamento na falta de pagamento de rendas vencidas durante o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, se o arrendatário não cumprir o pagamento nos 12 meses seguintes.
  • O regime da mora pode aplicar-se a uma habitação secundária.

APOIO FINANCEIRO

  • Concessão pelo IRHU, I.P. de um empréstimo sem juros para suportar a diferença entre o valor da renda mensal devida e o valor resultante da aplicação ao rendimento do agregado familiar de uma taxa de esforço máxima de 35 %, de forma a permitir o pagamento da renda devida, não podendo o rendimento disponível restante do agregado ser inferior ao indexante dos apoios sociais (IAS) (€ 438,81);
  • Aplica-se, apenas, ao arrendamento de habitação permanente;
  • Podem ser beneficiários os arrendatários habitacionais e os fiadores, no caso de estudantes que não aufiram rendimentos de trabalho, que, tendo comprovadamente a quebra referida em A) supra, sejam incapazes de pagar a renda da sua habitação permanente ou, no caso de estudantes, que constituem residência por frequência de estabelecimentos de ensino localizado a uma distância superior a 50 km da residência permanente do agregado familiar;
  • Não se aplica aos arrendatários cuja quebra de rendimentos determine a redução do valor da renda, no âmbito de regimes especiais de arrendamento ou de renda, como o arrendamento apoiado, a renda apoiada e a renda social;
  • Podem, ainda, ser beneficiários deste empréstimo os senhorios habitacionais que tenham, comprovadamente, a quebra de rendimentos referida em B) supra desde que os arrendatários não recorram a empréstimo do IHRU, I. P. Este empréstimo sem juros visa compensar o valor da renda mensal, devida e não paga, sempre que o rendimento disponível restante do agregado desça, por tal razão, abaixo do IAS.

Forma de demonstração da quebra de rendimentos:

A quebra dos rendimentos do arrendatário, do estudante com contrato de arrendamento para habitação situada a uma distância superior a 50 km da residência permanente do seu agregado familiar, para frequência de estabelecimento de ensino e do Fiador de arrendatário habitacional que seja estudante e não aufira rendimentos do trabalho é demonstrada:

  • Pela comparação entre a soma dos rendimentos dos membros do agregado familiar no mês em que ocorre a causa determinante da alteração de rendimentos com os rendimentos auferidos pelos mesmos membros do agregado no mês anterior ou,
  • No caso de membros do agregado habitacional em que a maior parte dos seus rendimentos derive de trabalho empresarial ou profissional da categoria B do CIRS, quando a faturação do mês anterior à ocorrência da quebra de rendimentos não seja representativa, estes podem optar por efetuar a demonstração da diminuição dos rendimentos com referência aos rendimentos do período homólogo do ano anterior, mantendo-se o disposto anteriormente para os restantes membros do agregado.

No caso dos senhorios a quebra é demonstrada:

  • Pela comparação entre a soma dos rendimentos dos membros do respetivo agregado familiar no mês em que se verifica o não pagamento das rendas devidas pelos seus arrendatários com os rendimentos auferidos pelos mesmos membros do agregado no mês anterior, ou
  • No caso de membros do agregado habitacional em que a maior parte dos seus rendimentos derive de trabalho empresarial ou profissional da categoria B do CIRS, quando a faturação do mês anterior à ocorrência da quebra de rendimentos não seja representativa, estes podem optar por efetuar a demonstração da diminuição dos rendimentos com referência aos rendimentos do período homólogo do ano anterior, mantendo-se o disposto anteriormente para os restantes membros do agregado.

Rendimentos considerados relevantes para efeitos de demonstração da quebra:

a) No caso de rendimentos de trabalho dependente, o respetivo valor mensal bruto;

b) No caso dos rendimentos empresariais ou profissionais da categoria B do CIRS, o valor antes de IVA;

c) No caso de rendimento de pensões, o respetivo valor mensal bruto;

d) No caso de rendimentos prediais, o valor das rendas recebidas;

e) O valor mensal de prestações sociais recebidas de forma regular;

f) O valor mensal de apoios à habitação recebidos de forma regular;

g) Os valores de outros rendimentos recebidos de forma regular ou periódica.

 Comprovativos:

  • Os rendimentos de trabalho dependente são comprovados pelos correspondentes recibos de vencimento ou por declaração da entidade patronal;
  • Os rendimentos empresariais ou profissionais são comprovados pelos correspondentes recibos, ou, nos casos em que não seja obrigatória a sua emissão, pelas faturas emitidas nos termos legais;
  • Os rendimentos referidos nas alíneas c) a g) supra são comprovados por documentos emitidos pelas entidades pagadoras ou por outros documentos que evidenciem o respetivo recebimento, nomeadamente obtidos dos portais da Autoridade Tributária e Aduaneira e da Segurança Social ou ainda pela declaração sob compromisso de honra do beneficiário, quando não seja possível a obtenção daquela declaração, atenta a natureza da prestação;
  • A quebra de rendimentos do Senhorio derivada da falta de pagamento da renda pelo arrendatário é demonstrada por aquele através da correspondente comunicação do arrendatário.

Quando não seja possível a obtenção dos comprovativos do valor dos rendimentos referidos nas alíneas b) a f) supra, os rendimentos podem ser atestados mediante declaração do próprio, sob compromisso de honra, ou do contabilista certificado no caso de trabalhadores independentes no regime de contabilidade organizada.

Os comprovativos dos rendimentos objeto destas declarações devem ser entregues no prazo máximo de 30 dias após a data de comunicação ao senhorio ou do requerimento apresentado ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I. P., consoante for o caso, salvo se a obtenção do comprovativo ainda depender, à data, de emissão por entidade competente para o efeito, caso em que esse facto deve ser comunicado ao senhorio ou ao IHRU, I. P., consoante for o caso, com indicação da data prevista para a respetiva obtenção.

Os arrendatários que não possam proceder ao pagamento da renda têm o dever de informar o senhorio dessa impossibilidade, por escrito, até 5 dias antes do vencimento da primeira renda em que pretendam beneficiar destes regimes, juntando a documentação comprovativa da quebra de rendimentos.

Esta comunicação deve ser feita, preferencialmente, por correio eletrónico.

Para as rendas que se vençam no dia 1 de abril de 2020, a notificação ao senhorio pode ser feita até 20 dias após a entrada em vigor da lei, ou seja, até 27 de abril de 2020.

As pessoas que, para efeito de demonstração da quebra de rendimentos, entregarem ou subscreverem documentos que constituam ou contenham falsas declarações, são responsáveis pelos danos que venham a ocorrer, bem como pelos custos incorridos com a aplicação das referidas medidas excecionais, sem prejuízo de outro tipo de responsabilidade gerada pela conduta, nomeadamente criminal.

ARRENDAMENTO NÃO HABITACIONAL

  • O regime estatuído na Lei n.º 4-C/2020 quanto ao arrendamento não habitacional prevê, apenas, soluções para os arrendatários e de entre estes, apenas para os seguintes:
  • Estabelecimentos abertos ao público destinados a atividades de comércio a retalho e de prestação de serviços encerrados ou que tenham as respetivas atividades suspensas ao abrigo do Decreto n.º 2-B/2020, de 2 de abril, ou por determinação legislativa ou administrativa, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, na sua redação atual, ou ao abrigo da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, na sua redação atual, da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 95/2019, de 4 de setembro, ou de outras disposições destinadas à execução do estado de emergência, incluindo nos casos em que estes mantenham a prestação de atividades de comércio eletrónico, ou de prestação de serviços à distância ou através de plataforma eletrónica;
  • Estabelecimentos de restauração e similares, incluindo nos casos em que estes mantenham atividade para efeitos exclusivos de confeção destinada a consumo fora do estabelecimento ou entrega no domicílio, nos termos previstos no Decreto n.º 2-B/2020, de 2 de abril, ou em qualquer outra disposição que o permita.
  • O arrendatário que preencha os requisitos indicados supra pode pagar as rendas que se vençam durante o estado de emergência e no primeiro mês subsequente durante o prazo de 12 meses contados do termo daquele período;
  • O pagamento é efetuado em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total devido, pagas juntamente com a renda de cada mês;
  • O arrendatário tem o mesmo dever de informação ao senhorio previsto para o arrendatário habitacional;
  • Durante este período não é exigível o pagamento de quaisquer penalidades que tenham por base a mora no pagamento das rendas;
  • Impossibilidade de invocação da falta de pagamento das rendas que se vençam nos meses em que vigore o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, como fundamento de resolução, denúncia ou outra forma de extinção de contratos ou como fundamento de obrigação de desocupação de imóveis;
  • Não está previsto um regime de apoio financeiro tal como o que se aplica ao arrendamento habitacional.

ENTIDADES PÚBLICAS

  • As entidades públicas com imóveis arrendados ou cedidos sob outra forma contratual podem, durante o período de vigência da presente lei, reduzir as rendas aos arrendatários que tenham, comprovadamente, uma quebra de rendimentos superior a 20 % face aos rendimentos do mês anterior ou do período homólogo do ano anterior, quando da mesma resulte uma taxa de esforço superior a 35 % relativamente à renda;
  • Não se aplica aos arrendatários que sejam beneficiários de regimes especiais de arrendamento habitacional ou de renda, como o arrendamento apoiado, a renda apoiada e a renda social;
  • Possibilidade de isentar do pagamento de renda os seus arrendatários que comprovem ter deixado de auferir quaisquer rendimentos após 1 de março de 2020;
  • Possibilidade de estabelecer moratórias aos seus arrendatários.

A cessação do contrato por iniciativa do arrendatário torna exigível, a partir da data da cessação, o pagamento imediato das rendas vencidas e não pagas, nos termos da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril.

14 de abril de 2020

Filipa Correia Pires